História Mundial
O Despertar Religioso nos Finais do Século XVIII
Nos finais do século XVIII e inícios do século XIX, tanto na Europa como no Novo Mundo, o homem questionava seriamente sobre si mesmo, o mundo em que vivia, a existência de um Universo, o sentido da vida humana e a sua finalidade. Muita coisa foi posta em causa, o próprio modo como o homem via o mundo e o explicava, a sua relação com a Natureza e os seres vivos. Como referiu o filósofo Emmanuel Kant, o homem estava saindo da sua menoridade.
Em algumas igrejas cristãs, surgiu o desejo de saber mais acerca de Deus e da Sua relação com a história humana: a necessidade de aprofundar a fé pessoal em um Deus também pessoal; e o dever de transmitir, a um mundo em constante mudança e agitação, a imagem de um Deus de amor que deseja salvar e transmitir uma vida nova a todas as pessoas. A este fenômeno, chamamos despertamento ou reavivamento.
Entre as principais características do reavivamento deste período, destacam-se: interesse pelo estudo da Bíblia, reforma dos costumes e uma reflexão escatológica (quer dizer, uma atenção particular sobre o ensino bíblico do regresso de Jesus Cristo e dos sinais do fim do mundo). É neste contexto que se insere a propagação das ideias de Guilherme Miller nos Estados Unidos, a partir de 1831 e mais tarde, a partir de 1861 da Igreja Adventista do Sétimo Dia.
Guilherme Miller e o Estudo das Profecias Bíblicas
Guilherme Miller, nasceu em 15 de Fevereiro de 1782 em Pittsfield, no estado do Massachussetts, Estados Unidos, numa família piedosa e modesta. Casou-se aos 21 anos e instalou-se em Poultney no estado do Vermont. Homem culto com grande sentimento de justiça, cumpriu as funções de juiz e de sherife da pequena localidade. Miller partilhava as ideias deístas do seu tempo. No entanto, os horrores da guerra que presenciou entre 1812-1814, contra os ingleses afetaram-no profundamente. Dois anos mais tarde a morte do pai, colocou-lhe questões acerca da morte. Instalou-se em Low Hampton, no estado de Nova Iorque, para gerir os bens do pai e cuidar da sua mãe. Começou a frequentar a igreja do tio que era pastor Batista. Um certo dia, foi convidado a ler a pregação em substituição do diácono de serviço. O texto de Isaías 53 chamou-lhe a atenção. Começou a estudar a sua Bíblia, em particular as profecias bíblicas. O cumprimento das profecias da Bíblia deram-lhe a prova de que necessitava para crer na veracidade das Escrituras.
Os livros de Daniel e Apocalipse atraíram em particular a sua atenção. Adotando o princípio de interpretação que reconhece que em profecia um dia profético, simboliza um ano literal, ao ler na versão King James o capítulo 9 de Daniel chegou a uma conclusão. Os comentários da versão inglesa King James, tomavam como ponto de partida para a profecia das 70 semanas de Daniel 9, o sétimo ano do reinado de Artaxerxes, ou seja, o ano 457 A.C.
Como 70 semanas em profecia é igual a 490 anos, esta profecia chegava ao ano 33 da nossa era. O Ungido que seria arrancado na última semana era Cristo que morreu por volta do ano 30.
Para Miller, esta profecia estava ligada à profecia de Daniel 8:14 que diz : “Até duas mil e trezentas tardes e manhãs e o santuário será purificado”. Aplicando o mesmo princípio bíblico dia/ano, era óbvio que estes 2300 dias representavam 2300 anos. Retirando 2300 anos ao ano 457 da era antiga, ficam 1843 anos.
Considerando que o santuário que deveria ser purificado era a terra, Guilherme Miller concluiu que o regresso de Jesus à terra ocorreria em 1843. Estava-se em 1818, e esta descoberta ocorreu dois anos depois de ter começado a estudar a Bíblia.
Guilherme Miller, não foi o único nem o primeiro a chegar a estas conclusões. Sem o saber, Miller desenvolveu as ideias do jesuíta Manuel Lacunza (1731-1801), de Gutierry de Rozas, jurista mexicano, advogado junto do tribunal da Inquisição (1835), de Adam Burwell, missionário canadense da Sociedade para a propagação do Evangelho (1835),de R. Scott, pastor anglicano e depois pastor Batista (1834) , do missionário inglês, Joseph Wolff (1829) e de muitos outros.
O Movimento Milerita
É apenas em 1831, que Guilherme Miller começou a propagar as suas ideias. Depressa se iniciou um movimento de reavivamento: Durante 4 anos percorreu cidades e vilas, respondendo aos convites que lhe eram dirigidos para partilhar as suas descobertas. Durante esse período pregou mais de 800 sermões e muitas comunidades aceitaram a sua mensagem. Pastores de diferentes confissões religiosas aderiram à pregação de Miller. Com o apoio de Josué Himes, pastor Batista e de Josias Litch, pastor metodista, o movimento tomou outra amplitude. Revistas foram editadas como a Revista “Signs of the Times” e “Midnight Cry” e vários folhetos foram distribuídos.
Os anos 1840 a 1843 foram dedicados à pregação da mensagem de advertência em vista do regresso de Jesus Cristo. A data da volta de Jesus foi fixada para 22 de Outubro de 1844.
O dia 23 de Outubro trouxe a amarga verdade : Jesus Cristo não tinha regressado. A 10 de Novembro de 1844 através de uma declaração oficial em Boston, os responsáveis do Movimento reconheceram o seu erro quanto à interpretação do acontecimento, sem colocarem em causa a cronologia bíblica. Muitos membros do Movimento abandonaram e regressaram às suas igrejas de origem, outros que ficaram, procuravam encontrar resposta às questões e à esperança bíblica.
Guilherme Miller, ia visitando alguns desses grupos, procurando encorajá-los a guardarem a sua fé. Morreu cego a 20 de Dezembro de 1849. Do grande movimento Milerita que segundo alguns teria alcançado o número de 1 milhão de seguidores, várias denominações se formariam : The Evangelical Adventists, organizados em 1858 The Advent Christians, organizados em 1861 A Igreja Adventista do Sétimo Dia The Church of God, organizada em 1866 The Life and Advent Union The Churchs of God in Christ Jesus A existência destas denominações espelha um pouco a amplitude e a importância que o movimento Milerita teve nos Estados Unidos nos finais do século XIX.
O Nascimento da Igreja Adventista do Sétimo Dia
No seguimento da desorientação sentida, pelo desapontamento de 22 de Outubro de 1844, um grupo de pessoas composto por Joseph Bates, Hiram Edson, James White e pessoas mais cultas como John Andrews, John Lougborough e Urias Smith, procuraram estudar melhor a Bíblia e encontrar uma explicação para o sucedido.
Foi Hiram Edson quem acabou descobrindo que tudo estava correto na pregação de Miller, exceto a relação santuário = Terra. Um estudo mais abrangente da Bíblia feito com O.R.L. Crosier, levou-os a concluir em conformidade com o que a epístola aos Hebreus ensina sobre o ministério de Cristo no santuário celestial, aquilo que o livro de Levíticos (cap.16) diz sobre o Dia da Expiação, que a profecia de Daniel 8:14, apontava para a purificação do santuário celestial e não para o regresso de Cristo à terra.
Outras verdades bíblicas foram sendo apresentadas, como a verdade sobre o sábado, primeiramente introduzida por Rachel Oakes em 1844 e defendida de forma mais sistemática por Joseph Bates.
Com o passar do tempo, faz-se premente a existência duma organização. Em 1852, havia já 2000 membros, havia publicações editadas regularmente, era necessário definir regras de organização, era necessário credenciar os pastores. Existiam no entanto algumas resistências em adotar um nome e uma organização. Foi preciso esperar até 1860, para ser adotado em assembleia-geral, em Battle Creek o nome “Adventistas do Sétimo Dia” que definia este grupo de crentes. O nome Adventista, traduz a esperança do regresso de Jesus Cristo, do Sétimo Dia, porque em conformidade com a Bíblia, observam o sábado como dia de repouso semanal. Em 03 de Maio de 1861, registrou-se a Associação Publicadora dos Adventistas do Sétimo Dia”, em Outubro do mesmo ano, a “Associação dos Adventistas do Sétimo Dia do Michigan” e finalmente em 1863 é fundada a Conferência Geral dos Adventistas do Sétimo Dia, que contava com 3500 adventistas, 30 pastores e 152 igrejas.
O Papel de Ellen White na Igreja Adventista do Sétimo Dia
Ellen Harmon, nasceu a 26 de Novembro de 1827 numa pequena quinta de Gorham, no estado do Maine. Aos 8 anos de idade um acidente na escola, durante o qual uma colega a atinge com uma pedra no nariz, quase a leva à morte e impede-a de seguir uma escolaridade normal. As sequelas desse acidente vão repercutir-se na sua saúde que será sempre frágil.
A família de mais sete irmãos frequentava a igreja metodista, até que em 1840, a aceitação das ideias de William Miller, levou-os a serem expulsos dessa igreja.
Em Dezembro de 1844, ela teve uma visão sobre o futuro da igreja Adventista. Aceita por uns, contestada por outros, ela continuou a partilhar com quem a queria ouvir o conteúdo das suas visões.
Ao longo da sua vida teve mais de duas mil visões, a maioria das quais registrou em livros e em artigos. Tônica dominante da sua vida, foi sempre de dar o primeiro lugar à Bíblia como regra de fé e norma de conduta para todos os crentes. Lutou nos seus escritos contra o fanatismo e o excesso de zelo religioso. Nunca se considerou a si mesma como profetiza, mas sim como mensageira.
Casou em 30 de Agosto de 1846 com Tiago White e partilhou com ele uma vida de privações e de lutas, enquanto a igreja adventista ia tomando forma. Dedicou-se a escrever sobre vários temas e no momento da sua morte em 1915, tinha escrito cerca de 45.000 páginas datilografadas, ou seja um total de 60 volumes, 4500 artigos revistas e mais de mil cartas. A sua influência na igreja Adventista manifestou-se sobretudo no encorajamento da organização da igreja, nos conselhos de saúde, em especial na abstinência do tabaco e do álcool, nas recomendações de uma vida equilibrada, enfatizando o aspecto preventivo da saúde e o cuidado com a alimentação. Foi com base nos seus conselhos que uma clínica foi aberta em Battle Creek em 1866. Lutou também pela promoção da educação. Sob a sua influência várias escolas primárias foram abertas
Ellen White preconizava uma educação capaz de desenvolver o ser humano em todas as áreas da existência e não apenas no ponto de vista intelectual. Do ponto de vista doutrinário, os seus escritos exaltaram sempre o estudo da Bíblia, norma de vida e de julgamento. Uma das suas obras mais importantes, “O Desejado de Todas as Nações” retrata e comenta a vida de Jesus, de acordo com os Evangelhos.
Após a morte do marido, em 1881, ela viajou bastante. Esteve na Europa (1885-1887), na Austrália (1891-1900), ajudando ao estabelecimento da igreja nestes continentes.
Regressada aos Estados Unidos, fixou residência em Santa Helena, Califórnia, mas continuou, sempre que a saúde lhe permitia a viajar dentro do país, procurando servir a igreja que amava.
Faleceu a 16 de Julho de 1915, com a idade de 87 anos. Um jornalista escreveu acerca dela, o seguinte : “Recebeu ela verdadeiramente visões divinas? Foi ela verdadeiramente escolhida pelo Espírito Santo para ser dotada com o dom de profecia? Porque é que deveríamos dar uma resposta? De qualquer forma, ela foi absolutamente honesta na sua fé nas suas revelações. A sua vida era digna delas. Ela não mostrou nenhum orgulho espiritual e não procurou nenhum ganho sórdido. Ela levou a vida e cumpriu a obra de uma profetiza com dignidade” (The Independant, New York, 23 de Agosto de 1915).
A Igreja Adventista na Europa
A primeira pregação adventista na Europa data de 1864. Nesse ano, um antigo padre polaco, M.B. Czechowski, que se tinha convertido ao adventismo, numa viagem aos Estados Unidos, percorreu os vales valdenses do Piemonte e estabeleceu uma pequena comunidade em Torre Pellice.
Depois viajou para a Suíça e estabeleceu em 1866, em Tramelan, a primeira Igreja Adventista na Europa. Após a sua partida para a Polônia, alguns dos seus conversos descobriram um exemplar do órgão oficial da Igreja Adventista do Sétimo Dia, a revista Review and Herald. Tiveram assim conhecimento duma igreja organizada aos Estados Unidos. Enviaram então um dos membros da comunidade, J. Erzberger, que depois dum ano de formação, voltou para apoiar os adventistas suíços.
No entanto, como o número de conversos aumentava, após alguma insistência, a Conferência Geral, decidiu enviar John Andrews para que este pudesse fazer um trabalho mais amplo na Europa. Em 1874, Andrews embarcou a 14 de Setembro de 1874 juntamente com o seu filho Charles e a filha Mary. A esposa já tinha falecido há dois anos. A 16 de Outubro de 1874, chegaram a Neuchâtel. Andrews realizou uma verdadeira revolução na igreja. Abriu-se uma casa editora em Bale que difundia literatura para toda a Europa. A revista Sinais dos Tempos era difundida em francês, italiano e alemão.
Em 1877 uma outra comunidade adventista constituiu-se em Nápoles e dez anos mais tarde na Holanda. Em 1877 John Loughborough, realizou um vasto trabalho entre os Batistas do Sétimo Dia de Londres e Southampton. E pouco a pouco a pouco outros grupos constituíram-se na Bélgica, República Tcheca, Hungria e Polônia. No final do século, havia cerca de dez mil adventistas na Europa. Vinte cinco anos tinham passado desde a chegada de John Andrews, que infelizmente não chegou a ver os frutos do seu trabalho. Morreu vítima da tuberculose em 21 de Outubro de 1883 com a idade de 51 anos, mas as raízes do Movimento Adventista, essas estavam lançadas e continuariam a progredir, graças aos esforços de tantos outros homens e mulheres, dedicados tal como Andrews em apresentar à sociedade uma mensagem bíblica relevante, integral e proveitosa para os vários domínios da existência humana.
A Igreja Adventista no Brasil
Conforme dados históricos, a colportagem entrou no Brasil primeiramente na região de Rio Claro, Piracicaba e cidades da região, no Estado de São Paulo.
Segundo a Seventh-Day Adventist Encyclopedia, o primeiro Adventista do Sétimo Dia a visitar o Brasil foi L. C. Chadwuick, que esteve no Rio de Janeiro, em agosto de 1892.
O primeiro colportor adventista a entrar no Brasil, por designação da Associação Geral dos Adventistas do Sétimo Dia, foi Albert B. Stauffer trabalhou primeiramente em São Paulo e depois no Rio de Janeiro, e nos Estados do Rio Grande do Sul (1894) e Espírito Santo (1895). Ele só vendia livros em inglês e alemão, pois nesse tempo não existia literatura adventista em português.
O primeiro pastor adventista do sétimo dia ordenado a entrar no Brasil foi Frank H. Westphal, em fevereiro de 1895. Ele também realizou, aqui o primeiro batismo, de Guilherme Sttein Jr. em abril de 1895, na cidade de Piracicaba, interior de São Paulo.
Guilherme Stein Jr. conheceu a mensagem adventista estudando sozinho as Escrituras Sagradas.
Os familiares de Guilherme Stein Jr. foram batizados na cidade de Indaiatuba, e organizaram a primeira escola sabatina do Brasil.
Antes de Guilherme Stein Jr., Guilherme Belz, da região de Braunchweig (hoje Gaspar Alto), Santa Catarina, também chegou ao conhecimento da mensagem adventista estudando sozinho a literatura adventista.
Ele se tornou o primeiro brasileiro a reconhecer o sábado como dia de descanso, após a leitura de um papel de embrulho, que conseguira no armazém de Davi Hort em Brusque, Santa Catarina, e do livro Gedanken, Krittisch und Praktisch, über das Buch Daniel (Reflexões, Críticas e Práticas Sobre o Livro de Daniel), de Uriah Smith.
Não foi encontrada, nenhuma série de estudos bíblicos produzida em português no Brasil, nesse período inicial da Igreja. Tudo indica que os primeiros adventistas se preparavam para o batismo mediante o estudo direto da Bíblia ou dos livros de colportagem em inglês e alemão, principalmente do livro Der Grosse Kampf zwischen Licht und Finsternis (O Grande Conflito entre a Luz e as Trevas).